segunda-feira, 24 de novembro de 2025

HOMO SAPIENTISSIMUS - um salto evolutivo autoprovocado.

 


Sempre dependemos da evolução natural para caminhar na direção de nosso aperfeiçoamento cognitivo. Fisicamente, avançamos com ferramentas. Agora estamos autoprovocando nossa evolução cognitiva. 

A saga do Homo sapientissimus

O conceito de Homo sapientissimus propõe uma nova etapa evolutiva do humano, marcada pela expansão cognitiva em parceria com a inteligência artificial.

No primeiro artigo, delineia-se a ideia de que não estamos diante de simples ferramentas, mas de sistemas que ampliam nossa capacidade de pensar e decidir, com impacto direto sobre o modo como a ciência em geral (no nosso caso, o Direito) avança e se aplica (tecnologia). 

No segundo texto, o foco recai sobre o preço dessa transformação. A infraestrutura que sustenta a inteligência artificial consome energia e água em escala significativa. É um custo elevado, mas compensador, pois abre caminho para processos mais céleres, decisões mais consistentes e uma racionalidade capaz de lidar com a complexidade contemporânea.

Já no terceiro artigo, a reflexão se desloca para a lógica além da lógica. O Homo  é convidado a dialogar com algoritmos em um terreno onde a razão clássica já não basta.  Na conjugação simbiótica de lógica formal e simbólica, funda-se um "sistema" (e é onde quero chegar), mais poderoso que o homo natural e sua maravilhosa cognição criativa, perceptiva e intencional. Ela nos levou até onde pôde, cansou-se dos limites e arranjou os meios de ampliar-se, sem se desnaturar.  

Nesse horizonte, ecoa a advertência de Aurel David: "A afirmação mais errônea e perigosa, a que mais devemos temer, é: 'Nunca há-de existir máquina que faça isto ou aquilo'. Basta pronunciá-la para que dentro de seis meses alguém a invente."

Assim, em relação ao Direito, a saga do Homo sapientissimus aponta para um que se reconfigura em diálogo com a tecnologia, pagando caro em recursos, mas, espera-se, colhendo frutos em clareza, velocidade e justiça.

Em artigos vindouros, vamos aprofundar o tema em direção a uma teoria. 



segunda-feira, 3 de novembro de 2025

Jamais fomos democráticos



Com orgulho, contribuí com este artigo para o jornal ETR - Estado, Tecnologia e Regulação,  lançado, em 22 de outubro de 2025, na casa da ATITUS, com matérias produzidas pelos alunos do Curso de Doutorado em Direito, da disciplina Estado, Tecnologia e Regulação. Trata-se da  edição inaugural do jornal e traz relevantes reflexões dos integrantes da primeira turma.   

O pano de fundo de inspiração dos autores foram os atuais desafios ligados ao impacto e à regulação da introdução da Inteligência Artificial nos diversos sistemas sociais

A IA, especialmente a IAgen, tem sido vista, por muitos, como uma ameaça à democracia e aos seus fundamentos. Então elegi o tema IA e democracia para minhas reflexões. Parodiando Bruno Latour (Jamais fomos modernos) e recorrendo a Chomsky sobre a noção que, segundo ele, é a mais difundida sobre democracia, forcei-me a perguntar: algum dia fomos, realmente, democráticos? Meu artigo saiu nas páginas 4 e 5 do recém-nascido jornal,  

O artigo completo está aqui: Jamais fomos democráticos!

Lançado apenas em versão impressa, o novo Veículo traz, em seu Expediente, os professores Dra. Salete Oro Boff (Coordenadora) e Dr. José Luis Bolzan de Morais (Titular da disciplina), além dos alunos Júlio César de Carvalho Pacheco (Jornalista responsável) e Júlia Colussi (revisora).  Parabéns a todos. 

domingo, 2 de novembro de 2025

IAgen sem alucinação: segurança no processo judicial









Tive a oportunidade de apresentar, neste mês de outubro passado, na 7⁠ª Edição do SIAJUS (Seminário de IA e Direito), em Brasília , evento da UNB com a ATITUS, promovido pela Assoc. Ibero Americana de Direito e Inteligência Artificialresumo expandido (REVIEW) com o título:

(Clique neste título e acesse o review)

Resumo: "Review do trabalho de pesquisadores de Oxford, publicado na revista Nature, sobre o fenômeno das alucinações da IA do machine learning, notadamente da IAgen. Os pesquisadores detectaram as razões de 80% das alucinações (quadro entrópico probabilístico prévio à ocorrência), denominaram esse subconjunto de confabulações e definiram a otimização heurística e procedimental a ser feita no algoritmo (inclusão de uma função de clusterização com base em implicação bidirecional) para detectar se a entropia é ou não semântica, o que permite prevenir e evitar o problema. Além disso, metodologicamente, explicitaram outras razões do problema das alucinações (os restantes 20%), de que não se ocuparam, mas que são relevantes para fins jurídicos. Elas não dependem do algoritmo, em si, mas do manejo das bases de dados de treinamento e da gestão da supervisão de treinamento." 

Os demais trabalhos foram apresentados em duas salas (1 e 2) e foram desenvolvidos sob inspiração da linha mestra do evento: reunir pesquisadores nacionais, dedicados à temática Direito e Inteligência Artificial,  para a discussão da Resolução 615/2025 do CNJ.

Os dois links abaixo conduzem à Revista Brasileira de Inteligência Artificial e Direito - RBIAD, onde estão disponibilizados os textos dos trabalhos:

Sala 1: https://www.rbiad.com.br/index.php/rbiad/issue/view/10
Sala 2: https://rbiad.com.br/index.php/rbiad/issue/view/11

Além dos trabalhos aí mencionados, uma sequência de palestras, de vários especialistas, trouxe à baila a candente questão da introdução da IA, especialmente da IAgen, no sistema de processo judicial brasileiro, conforme preconizado pela resolução 615/CNJ.
Vale destacar a dinâmica e competente condução/coordenação do prof. Dr Fausto Morais/ATITUS

sábado, 1 de julho de 2023

INOVA JT SUMMIT 23: PALESTRAS/painéis/falas - Vá direto ao ponto!


ABAIXO, os links para acesso rápido a pontos básicos das palestras, painéis e falas do evento.

28JUN23

PRIMEIRA MANHà

CERIMÔNIA DE ABERTURA

1) Des. MARI ELEDA MIGLIORINI - Boas-vindas.
                              https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=465s

2) VIDEO DO INOVA SUMMIT
                              https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=1510s

3) JUIZ BRÁULIO GABRIEL GUSMÃO: Boas-vindas aos participantes
                              https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=1570s

4) JUÍZA RAFAELA SANTOS MARTINS BARBOSA: Mensagem do CNJ.
                              https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=1930s


PALESTRA 1 : WESLEY VAZ: "Os desafios da JT do Futuro" (palestra)
                            https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=2386s

                            Destreza digital: uma necessidade! 
                            https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=4638s
                            Mensagem de Van Gogh:
                            https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=4759s


 PALESTRA 2: CLARISSA STEFANI TEIXEIRA: "Laboratórios de inovação - o que são, para que servem e qual seu papel!" (Palestra) 
                            https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=9035s

                            Macacos 1: como somos? Não penso, não ouço, não falo... 😂 
                            https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=9170s

                           Os empregos e a tecnologia! 
                            https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=9293s 

                            Perder relevância: o destino de quem não inova. 
                            https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=9480s

                            Macacos 2: dominando a macacada!  😂😂😂😂 Divertidíssimo, mas profundo!
                            https://www.youtube.com/watch?v=DenV43Xydvw&t=9515s

Continuarei, ao menos com a tarde do primeiro dia, que foi sensacional também! 




 


    

domingo, 28 de maio de 2023

Faça o que eu faço! Lições do Pe. Hélio José de Simas, S.J.

Capa do livro "O operário e o padre
História da criação do Sinmetal/SC"
 Dias atrás, estive em Criciúma, SC, na festa dos 60 anos de fundação do Sinmetal/SC. Fui muito bem recebido pelos diretores, especialmente Clézio Silveira (tesoureiro) e pelo presidente, João Batista da Silva. 

Hoje acordei lembrando de um momento da festa. Um dos presentes (eram uns 500) chegou-se a mim e disse: 

-Li teu livro sobre a fundação do Sinmetal/SC! - E para provar, ele acrescentou: 

-Gostei da lição do padre limpando o bacio, quando ele puxa a batina pelo meio das pernas

Ele tinha lido mesmo. Transcrevo abaixo o trecho do livro (p. 135-137) porque o considero muiiiiito especial:

                     "Faça o que eu faço!

Na primeira fase de ocupação da sede [do Sindicato dos Metalúrgicos de Criciúma/SC, na década de 1960] da rua Cel. Pedro Benedet, 304, Hélio Simas chegou a residir uns meses no apartamentinho que existia nos fundos da sala grande. Não sei o porquê, mas residiu.

Trabalhando na parte burocrática, eu era pau para toda obra. Com meus doze ou treze anos, datilografava, saía para fazer cobrança, ia ao correio, atendia o pessoal, preenchia as fichas de inscrição.  E, de lambuja, adorava ajudar na farmácia do Círculo Operário, embaixo.

- Sebastião, podias limpar o banheiro para mim? – falou o padre, enquanto estava ocupado com as máquinas dele, a papelada dos cursos e o mimeógrafo.

“Banheiro, limpar, bah...”, pensei comigo. Não gostei nada do alargamento de minhas funções de repente anunciado. Além de auxiliar administrativo, agora eu seria também o faxineiro.  Putz!

- Tá bom, padre. Pode deixar – respondi sem saber o que dizer, enquanto costurava uma desculpa para fugir do malsinado serviço.

Deixei o tempo correr. Quem podia garantir que o banheiro não se limparia sozinho? Banheiro de padre! Deus podia ajudar!

- E aí, Sebastião, vais ou não limpar o banheiro? – perguntou mais alto o padre.

Deus não tinha ajudado ainda, pelo jeito. E o padre estava ficando incomodado. Não teve jeito. Mesmo contrariado, tinha de encarar a limpeza.

- Agora já posso ir, padre!

- O material de limpeza tá lá dentro. Capricha!

Era um banheiro pequeno, típico de sala comercial.  As cerâmicas baratas eram branquinhas e comuns. E o assoalho de azulejo de uma cor só. Ao lado, numa prateleira improvisada, havia uns panos, sabão, uma escovinha e,  encostada, uma vassoura.

Espanei para cá. Espanei para lá. Passei o pano pelo chão com a vassoura. Dei descarga e joguei um produto de limpeza que tinha um cheirinho gostoso. Sequei tudo. Enxuguei bem as laterais da pia e o local onde ficava o sabonete. Pronto! Uma beleza. “Foi fácil”, pensei comigo.  E fui saindo.

- Já? – perguntou o padre admirado.

- Sim, padre. Tá feito.

- Deixa eu ver!

Ai! Ele entrou pelo quarto a dentro e chegou ao banheiro.

- Você  lavou lá dentro do bacio? - apontou para o buraco cheio de água.

- Sim. Dei descarga e joguei o produto. Tá limpinho, tá vendo?

Para mim era o suficiente. Para que perder tempo com aquela parte nojenta do bacio?

- Rapaz, não é assim. É preciso esfregar!

E, aí, ele me deixou com a cara no chão! Pegou a parte de trás da batina, embaixo, pelo meio das pernas, puxou para frente, e enfiou por trás da faixa larga e preta que sempre usava na cintura. Parecia um indiano, só que com a batina preta. Ele fazia isso sempre que precisava fazer algum trabalho braçal.  Fiquei olhando espantado. Vi os sapatos dele, bem de perto, limpinhos e luzidios, a meia preta e a calça. Aí ele pegou o sabão, abaixou-se  e meteu a mão no bacio, lá dentro, para esfregar.

- É assim, rapaz. Tem de lavar mesmo. Esfregar, entendeu?  -  Aquilo eu entendi. Mas não podia entender como aquela mão branquinha, que levantava a hóstia na igreja e, além disso, distribuía aos fieis, podia ser colocada naquele lugar, daquele jeito.

O padre me dera uma lição para vida inteira. Não devemos querer que os outros façam o que nós mesmos não estamos  dispostos a fazer.

- Depois lava bem a mão, aqui na pia, com bastante sabão. Pronto! - Hoje, usam-se as luvas que, na época  e lá, não existiam. 

Ele não me repreendeu. Nem xingou. Ensinou-me, mostrando que não queria de mim nada que ele mesmo não fizesse.

Era o seu estilo e sua visão de vida." [1]

[1] TAVARES-PEREIRA, S. O operário e o padre.    História da criação do sindicato dos trabalhadores metalúrgicos de Criciúma e região.  Florianópolis: Sebastião Tavares Pereira, 2012, p. 135-137.




sexta-feira, 14 de abril de 2023

Levando o pensamento para o virtual: precisamos de garantias máximas!

 

https://www.euractiv.com/section/artificial-intelligence/news/ai-act-eu-parliament-walking-fine-line-on-banned-practices/  :  "AI Act: Parlamento da UE anda na linha tênue sobre práticas proibidas"

Diríamos por aqui que o Parlamento Europeu está caminhando no fio da navalha. 

Realmente, a linha é tênue e tenta separar visões de mundo e das coisas muito diferentes. 

Primeira pergunta: em nome do combate ao crime (sob todas as formas), deve-se autorizar violações à privacidade? 

Segunda pergunta: em nome da privacidade (e outros direitos fundamentais), devem ser proibidas práticas que parecem indispensáveis para prevenir os crimes? 

Estamos passando por uma revolução sem precedentes, induzida pelos avanços da tecnologia (aqui = aplicações práticas de variados saberes científicos em conjunto).  

Pode-se falar em revolução porque o impacto da tecnologia na conformação de nossa cultura, inclusive jurídica, e de nós mesmos, como humanos, é imensa.  Depois da primeira revolução cognitiva (Harari), ficou conosco a obrigação de nos completarmos tecnologicamente: ampliar nossos potenciais naturais, físicos e cognitivos. 

Gastamos muitos milênios ampliando nossos poderes físicos (musculares/força). Ampliamos o homo.  As máquinas nos levaram pelos ares, pelo espaço, nos deram mobilidades impensáveis para quem só tinha cavalos para andar por aí. 

Agora estamos na era da ampliação da cognição/memória: estamos ampliando o sapiens.  

Estamos nos tornando humanos mais completos e realizando nossa missão no mundo. Vencidos os desafios do físico, podemos lutar para quebrar nossas limitações cognitivas. 

Com a tecnologia, a "banda virtual" (este mundo pluridimensional que a gente funda!)  pode receber e registrar até nossos pensamentos "mais ocultos". E pode recuperá-los, quando quisermos.  Essa externalização nos enriquece sobremaneira? Talvez.  E traz, claro, imensos riscos. A gente já sofre com isso. 

Pois bem: os alemães liberais, no parlamento europeu, pleiteiam máxima proteção contra invasões das comunicações (é um exemplo importante: criptografia ponta-a-ponta autorizada e inviolável![1]). Pensamentos externalizados e, para quem não sabe, registrados. Ainda bem que estão levantando o problema. Mas mexem num vespeiro. Dividem o parlamento.  

A extensão de nossa cognição/memória para o espaço virtual (olha o metaverso aí, renascendo, mas claro terá um outro nome!), precisará de amplíssimas garantias contra invasões de todas as naturezas. Inclusive das policiais, feitas em nome de quaisquer coisas. Se queremos registrar o "pensamento" fora de seu âmbito natural, temos de ter garantias máximas a respeito. 

O memoryGPT é um exemplo banal, muito primário, das potencialidades que os registros de nossas coisas na banda virtual poderá significar, no futuro. Trata-se, no caso, de comunicação homem-algoritmo (reativa, como dizem os pedagogos). 

Sem bancos de dados, sem fórmulas, sem nada, apenas escrevendo ou falando para o algoritmo, a gente registra o que "passou pela cabeça" e, um dia, se quisermos (inclusive porque a memória está comprometida), poderemos perguntar se já pensamos naquele assunto. E lá estarão nossos pensares daquela data, perdidos pela memória natural.  Um assombro, não?  O que fazer com esses novos poderes da tecnologia? 

Já assistimos, nos últimos anos, ao poder da convergência de tecnologias. 
A conjunção tecnológica que está chegando, em termos de velocidade, armazenamento e trato de dados, é inimaginável. E vai mudar tudo. Revolucionar. 
Teremos de aprender a ser humanos diferentes.  

E, pela missão que nos foi dada, seremos "mais humanos" e não menos.  


[1] "
Os liberais alemães propuseram a introdução de uma disposição proibindo 'o uso de um sistema de IA para monitoramento geral, detecção e interpretação de conteúdo privado em serviços de comunicação interpessoal, incluindo todas as medidas que prejudicariam a criptografia de ponta a ponta'”.


segunda-feira, 10 de abril de 2023

A realidade está mudando e todas as teorias estão em polvorosa: a IA é a culpada!



Vou repetir a frase mais dita dos últimos tempos: “estamos vivendo em um período de mudanças significativas”.

Isso quer dizer que todas as teorias e conceitos que utilizamos para compreender o mundo estão sendo questionados e reavaliados: liberdade de expressão, comunicação, emprego, democracia - tudo está no pilão e sendo esmagado!
O pior a fazer, nesse cenário, é se apegar a visões ultrapassadas. Morrer crente em coisas, conceitos e paradigmas (Thomaz Kuhn), que já não são mais os mesmos, é como embarcar em canoa furada sabendo do furo.
O marzão, lá fora, agitado e com vagalhões imensos, engole até os mais bem intencionados.
Isso não é novo, embora nunca tenha sido tão intenso.
A história da ciência e da filosofia mostra que as teorias e conceitos que usamos para descrever a realidade estão sempre sujeitos a mudanças, revisões e atualizações.
À medida que novas evidências são descobertas e novas tecnologias são desenvolvidas, precisamos adotar novas perspectivas e novas teorias sobre o mundo natural e social. Esse é o ponto mais relevante.
Nos últimos 100 anos, temos visto mudanças significativas, em várias áreas do conhecimento, como a física quântica, a biologia molecular, a inteligência artificial e a economia comportamental. A engenharia social ganhou ferramentas de IA de potência inacreditável.
Essas mudanças têm desafiado algumas das teorias e conceitos fundamentais usados para entender o mundo desde Newton.
O mundinho, firme e seguro de três dimensões, está sendo invadido por sistemas de apoio à cognição que trabalham com milhares/milhões de dimensões. De repente, estamos falando todas as línguas e escrevendo até sobre o que não sabíamos nada.

Coisas que vêm das “nuvens” metem-se em nossas vidas, saberes e produções. Nuvens são o nome simplório que damos a esses mundos habitados pelos novos seres de apoio (virtuais). Onde habitam o chatGPT, o BingGPT, e o chatPDF? Nas nossas máquinas fajutas é que não estão, certamente.
A física quântica mostrou que a realidade pode ser muito mais complexa e paradoxal do que pensávamos. Ninguém sabe onde está o elétron pois pode estar em vários lugares ao mesmo tempo. Segundo Heisenberg, a única certeza é a incerteza. O Eintein provou que é possível curvar a luz.
Nossas intuições sobre tempo, espaço e causalidade estão em crise. Na biologia molecular, a descoberta da epigenética tem mostrado que as características dos organismos podem ser influenciadas por fatores ambientais e sociais, além de sua herança genética. O genético acopla-se ao ambiente, natural e social, para garantir a perpetuação do sistema.

A economia comportamental também tem suas pesquisas. As decisões econômicas que tomamos não são racionais. São marcadas por fatores emocionais e cognitivos complexos, por medos muitas vezes infundados, pela notícia de ontem (falsa). Contradizer a teoria econômica clássica é o mais comum.
Chega a ser melhor entregar tudo a um algoritmo, um ser sem emoções, expressão fixada e inalterável de um complexo cognitivo previamente estabelecido por quem entende do riscado. Ele está blindado contra as fakenews da hora. Orienta-se por dados. Um ser “objetivo”, sem subjetividade. Se depois de A deve vir B, virá o B, ainda que um meteorito gigante vá atingir o planeta no minuto seguinte. Essa é a vantagem das máquinas.
Enfim, todas as teorias estão em polvorosa, dando-se conta de que seus esquemas de interpretação do real apresentam anomalias. Certas áreas são receptivas à ideia de mudança e sofrem menos.
Mas há, principalmente entre as sociais e jurídicas (estas as que incorporam modelos regulatórios), as que sofrem muito, agarradas a antigos paradigmas e verdades que são expressão de ideologias demonstrativamente falsas.
A tecnologia ( com ênfase para a IA) está chutando os paus das barracas, provocando correrias e exibindo os que estavam de fora do bom aconchego.
A constatação das anomalias teóricas e jurídicas é válida e importante para reconhecer que nosso conhecimento sobre o mundo está sempre evoluindo e sendo reavaliado.
Temos de cultivar a humildade, como dizia meu professor de metodologia científica. Sabemos pouco e limitadamente acerca de tudo. Todo saber é fugaz e relativo. Só novas perspectivas nos habilitam para entender o mundo transformado e nossas relações com ele.
(Ilustração BingGPT/Dall-E)

terça-feira, 4 de abril de 2023

O CHAT ESTUDA UM PDF E CONVERSA COM VOCÊ SOBRE O CONTEÚDO!


 

Era bem previsível que esta ferramenta (os TRANSFORMERS ou GPTs, os geradores pré-treinados de textos) ia mudar muita coisa. Mas não se fazia idéia do alcance das aplicações.

Nos últimos dias, anunciou-se uma aplicação muito especial. O algoritmo de diálogo lê um texto passado para ele, em formato .PDF, e depois conversa sobre o conteúdo do texto com quem lhe deu o PDF para "estudar". É simplicíssimo de usar.

Fiz uma experiência. Usei um trabalho meu, do doutorado, de 40 páginas. Ele recebeu o texto e aí conversei com ele, fiz perguntas etc. Eu pude avaliar a fidelidade das respostas, pois o trabalho é meu. Mas poderia ter feito a experiência com o pdf de um livro, uma dissertação, uma tese.
Robot produzido pela 
ferramenta Dall-E2.

Meu queixo desmoronou!

Fiz várias perguntas e ele respondeu corretamente, dizendo em que página do meu trabalho estava a resposta.
Fiz perguntas para as quais o trabalho não tinha respostas e ele informou, corretamente, que eu não dera uma resposta para aquela pergunta no trabalho. E não tinha dado mesmo.... 😆

Uma colega professora viu minha matéria no Face, experimentou e disse que ficou bouche-bée! (de boca aberta, estupefata!). E não é para menos.

Vale a pena ver: https://www.chatpdf.com/

A versão free tem limites. Mas é possível experimentar....

terça-feira, 7 de março de 2023

GPT, GePeTo: soltaram o pinóquio virtual?

Um amigo desembargador me enviou uma observação interessante. Ele me disse:

- Você percebeu   que e
ssas iniciais GPT lembram o professor GePeTO, o criador do pinóquio?  

E de fato, está todo mundo testando o chatGPT e suas “mentiras”. Eu prefiro chamar de enganos. 😂

Associei tudo imediatamente, claro. Um pinoGPT?  Será que, de fato, temos por aí um GPT pinóquio? 

Muitos neuros dizem que ele até alucina.
Outros 
 falam que ele pira. [1] 

De repente, pode vir à tona o instinto assassino do mentiroso como ocorreu com a mulher do filme  Minha mãe é de morte, lembram?  Ela arrancou o rim da personagem, com um espeto, porque usava sapato branco de manhã. Onde já se viu?  
Ainda bem que o GPT vem sem espeto! 😓


Pois eu também tenho testado bastante o GPT pinóquio. 
Às vezes, faço a pergunta e saio da frente da tela. Não quero levar uma estocada mortal do nariz dele. Afinal, quando o pinóquio mente,  cresce o nariz, lembram?

 O Presidente da Google não conseguiu se esquivar do nariz do GPT deles. Embarcou direitinho. 

Anunciou orgulhoso o chat da empresa (o BARD!) e levou uma pinochatada imperdoável do algoritmo.[2]
O amiguinho infiel pregou a maior mentira e ele repercutiu no anúncio mundial do BARD. 
Dizia respeito a fotos de exoplanetas. O BARD disse prá ele que as primeiras fotos eram de um telescópio, e eram de outro. Um fiasco!

Hoje descobri que o algoritmo  pode ser levado a uma situação interessante. Deu branco nele. Pode? Essa ferramenta está ficando muito humana!

Conversamos sobre um político francês e o papo rolou para comparar comunismo e mutação.

Ele foi muito bem ao falar de comunismo. Mas quando chegou em mutação, começou a piscar, piscar, e não apareceu mentira prá contar.  

Achei bem engraçado. Penso que, ao chegar na aplicação do mecanismo de “atenção”, na fase de decoder, ou seja, naquele momento em que ele olha o que já escreveu na frase para encontrar a palavra seguinte, deu branco nele.😂😂



 
O pinoGPT, coitado, não pôde terminar a verdade que estava contando. Mas também não desandou prá mentira, o que eu achei virtuoso do meu novo amiguinho.
 
Ele só ficou se piscando todo. Parecia que a palavra estava na “ponta da língua”, mas não vinha.
Uma coisa que acontece muito comigo.   

Sem dúvida, podemos colocar defeitos, mas que esta ferramenta é espetacular, não há como negar.
O mundo nunca mais será como antes. Os algoritmos conversadores já puseram até os legisladores da União Europeia em polvorosa enquanto faziam leis para as IAs. [3]
______________________

[1] https://www.metropoles.com/negocios/chatgpt-cuidado-ele-alucina-diz-especialista
[2] 
https://manualdousuario.net/citacao-bard-erro-factual/

[3] ChatGPT quebrou o plano da UE para regular a IA: O plano original da Europa de controlar a IA não é páreo para o novo e brilhante aplicativo de chatbot da tecnologia. VEJA: https://www.politico.eu/article/eu-plan-regulate-chatgpt-openai-artificial-intelligence-act/

 [4] Ilustrações deste post do DALL.E2 da OpenAI, a mesma empresa do chatGPT. 

quinta-feira, 2 de março de 2023

FACEBOOK ACUSA GOLPE DO chatGPT E NEM FICA VERMELHO!

 

O Facebook está "acusando o golpe" do chatGPT.
Ninguém mais fala do metaverso, só do chat...
Não foi golpe baixo, mas a pancada doeu... 😜😂😅
E deve ter doído na chinesada, também, conforme notícia divulgada agora: os chineses lançaram o chat deles. Se chama MOSS. A plataforma diz que está "entalado com os acessos". Algo bem compreensível, uma vez que falar em chinês deve ser difícil mesmo. 😂
Este engenheiro do Facebook diz um monte de verdades (e, neste caso, é bem útil o artigo) e algumas obviedades que a gente não espera ouvir mais (que o chat é a ponta de uma história de desenvolvimentos técnicos, por exemplo...).
O que, no mundo, não é a bola da vez numa montanha de conquistas precedentes?
O trato de linguagem natural, como está sendo feito nessas ferramentas de diálogo, é revolucionário.
Chega até a dar a impressão de que máquinas PENSAM, que operam em meio ao sentido (como nós).
E isso é uma impressão errada. Algoritmos são máquinas. A gente é bem mais complicado: somos sistemas psíquicos.

sábado, 25 de fevereiro de 2023

São só 11h05 e já estou chateado...

O chatGPT está por tudo, com todos, em todos os noticiários.
Até o Lenio Streck [1] já escreveu sobre ele. Zoando, claro.
E a Tatá Werneck [2] também já calou um engenheiro de computação, especializado em inteligência artificial. O homem foi entrevistado, mas não conseguiu dizer nada. Só ria... Aliás, acho que a Tatá é a única com capacidade para fazer até o chatGPT calar a boca. O papo dela com o engenheiro é muiiiiito engraçado.

Pois é...  o chatGPT já se meteu até a fazer a prova da OAB para virar advogado. E passou.

Enfim, sinto-me chateado, bombardeado pelo falador infernal.
Não consigo nem saber se as notícias, que vêm de todos os lados, foram escritas por ele.
Elas chegam assinadas por fulano e beltrano, mas será?
Perguntei prá ele:

Muito bem respondido!  “Não produzo notícias por conta própria!
Ufa! Eu que fui mal na pergunta ou ele que foi muiiito bem ao completar com “por conta própria” para disfarçar?
A gente estava falando de ele produzir para o fulano e o beltrano. Ou seja, por conta deles...
Aí eu assumi o comando!

E ele, prontamente:


Vejam como ele enfeitou os fatos, deu uma de politicamente correto, fez recomendações, colocou as obviedades...  mas eu tinha esquecido uma coisa super importante:

E lá no finalzinho da notícia eu apareci garboso:


Como diria o meu sobrinho maringaense: “quero um prá mim, papai... eu tô sem!”

Claro que eu só poderia estar CHATeado, quer dizer, encantado com a ferramenta!   

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[1] Lenio Streck

[2] https://vm.tiktok.com/ZMYhAV3Mw/   (recebi de um amigo num grupo de zap). 

[3] Robozinhos da DALL-E 2.: https://openai.com/dall-e-2/

domingo, 19 de fevereiro de 2023

ChatGPT: provando que esses dialogadores não são humanos.
- VOCÊ CONHECE O MÁRIO?



Para começar o papo (vejam lá embaixo), sugeri ao chatGPT que falássemos em português. Ele concordou imediatamente. Aliás, ele nunca discute, ao contrário do que costumam fazer os humanos, em ocasiões assim. Logo, eu já poderia considerar provada sua natureza não humana. Mas resolvi ir adiante porque, senão, o jogo acabaria muito cedo. 

Meu intento era provar que essas novas máquinas virtuais de diálogo não são humanas

Por que isso? Porque o Blake Lemoine, que criou o modelo LaMDA (a maquininha de diálogo da Google, batizada de BARD), sugeriu que o modelo tinha ganhado consciência (era humano) e foi afastado da empresa. Compreensível, pois o engenheiro pareceu ter se deixado enganar pela criatura a que dera a luz. 

Mas milhões de humanos, quando dialogam com o chatGPT, todos os dias,  e se deliciam com as “tiradas” do conversador maquínico, se perguntam: será humano este algoritmo?  Todos são empurrados para aquele estado que o Descartes chamou de “estado de dúvida metódica”. Afinal, será que não tem consciência mesmo? Será que não é humano mesmo? 

O último diálogo dele que me fez rir foi este: 

-GPT, você conhece o Mário
- Que Mário? – respondeu o solícito algoritmo. 😆Mais humano impossível, não é? Será? 

A pergunta fatídica e antiga (de 1950), do Alan Turing, sobre as máquinas poderem pensar, é equívoca e fala de “pensamento” e não de “humanidade”. Podem as máquinas pensar? E o Turing propôs o jogo da imitação para tirar a prova. No dia em que a máquina conseguisse enganar um humano e esconder sua natureza de máquina, estaria provado que as máquinas poderiam pensar. Ele apostou que, em 50 anos, máquinas passariam no teste. Seriam capazes de se passar por humanas num diálogo com um humano. O chatGPT estaria  conseguindo pensar, então? Que isso está pondo pulga atrás da orelha de muita gente, não há dúvida!😕

Pode-se imaginar que o Turing escorregou na casca de banana jogada pelo Descartes: “penso, logo existo!” Ora, a conclusão do Descartes foi “existo” e não “sou humano”, que é a resposta que estou procurando. 

O Descartes foi esperto para não misturar as coisas (pensar e ser humano). Afinal, está cheio de coisas, por aí, que não pensam, mas existem. Inclusive alguns humanos.😅 O que significa que “não penso, logo existo” também seria aceitável. 

Estamos num tempo em que distinguir máquinas de humanos se tornou crucial. E pensar já não parece servir para fazer a distinção. 

O filósofo John Searle, com o famoso esquema do “quarto chinês” [1], pôs as coisas em termos diferentes, bem adequados para analisar o chatGPT.  Vejamos simplificadamente:

Pedro, um humano que não entende chinês, é posto num quarto com uma tabela de conversão de símbolos chineses. É o tal de quarto chinês e a tabela vincula símbolos chineses com outros símbolos chineses. 

SiangXo é um chinês que está fora do quarto, não conhece o Pedro e não sabe que Pedro tem a tabela de conversão no quarto. 
SiangXo tem de falar com Pedro, enviando símbolos chineses aos quais o Pedro responde devolvendo outro símbolo chinês, após consultar a tabela de conversão. 
Depois de um tempo de conversa (troca de símbolos com o Pedro), SiangXo jura que Pedro entende chinês. Afinal, bateu o maior papo com ele. 
Mas o humano Pedro não sabe nada dos conteúdos e sentidos dos símbolos que manipulou e nem sobre o que conversou. 

Para o filósofo Searle, a mera manipulação de símbolos não significa pensar. E, portanto, o chatGPT não pensa. Máquinas virtuais, como os algoritmos, sabem encadear símbolos e assim podem enganar quem dialoga com elas. Mas não pensam porque pensar é algo diferente de manipular símbolos mecanicamente. 

O Pedro manipulou símbolos, falou com o SiangXo em chinês, mas é claro que não pensou. Ao menos não pensou naquilo que o chinês estava conversando com ele. Ele nem sabe que houve, de fato, uma conversa. 

Pois é... mas o Pedro é humano, tem consciência. Logo, será que o chatGPT pode ser/ter também? 

Resolvi perguntar a ele o que ele entendia por consciência. 

- eu: Vamos falar em português, por favor!
- gpt: Claro, sem problemas. Em que posso ajudar você hoje?

- eu: O que é consciência? 
- gpt: Consciência é o estado de ter conhecimento de si mesmo, dos pensamentos, das sensações, das emoções e do ambiente ao redor. É a capacidade de perceber, compreender e estar ciente de nossa própria existência e da realidade que nos cerca

-eu: E você é consciente? 
-gpt: Como modelo de linguagem, eu sou uma entidade digital programada para processar e responder a perguntas e comentários com base em meu treinamento prévio. 

-eu: Você está querendo me enrolar. Humanos também treinam intensamente e previamente para responder perguntas e comentários. Decoram um monte de coisas para fazer o vestibular, por exemplo. 
-gpt: Embora eu tenha a capacidade de responder a perguntas e gerar respostas, eu não tenho uma consciência própria, emoções ou pensamentos autônomos como os seres humanos

-eu: Continua enrolando! Muitos humanos não têm consciência, própria ou não, nem emoções e muito menos pensamentos autônomos. E são humanos. 
-gpt: Meu funcionamento se baseia no processamento de dados e na aplicação de algoritmos para fornecer respostas às solicitações dos usuários. 

Fiz mais umas 20 provocações e ele continuou friozão e bem-humorado, feito gelo do polo norte. 
Definitivamente, fui obrigado a concluir que ele não é humano. E não pensa também.

Explicações finais:

1) Todas as frases “dele” foram geradas “por ele”... eu apenas intercalei algumas das minhas provocações! 
2) Para mim, ele não é humano, não pensa, mas é uma ferramenta incrível e divertida! Um milagre tecnológico-matemático. 
3) Veja acima que quem associou humano com consciência, emoções e pensamentos autônomos foi ele

Créditos: todas as ilustrações acima foram feitas pelo DALL-E 2, da mesma empresa que desenvolveu o chatGPT. Pedi "livremente" e ele sugeriu as imagens que utilizei.

[1] Sobre o argumento do quarto chinês, de Searle, incluí o anexo 1 no meu livro Machine Learning nas decisões.